sexta-feira, outubro 26, 2007

BRILHANTE!!!! :D

adoooro ventriloquistas! este é mesmo brilhante!! Achmed the dead terrorist
Obrigadas Sergei! :)

terça-feira, outubro 16, 2007

Quando os animais envelhecem

A minha avó sempre teve gatos. Era eu pequenina e pegava num fio e fazia trinta por uma linha com os gatinhos, que apesar de tudo entravam com paciência nas minhas brincadeiras felinas. A minha avó sempre disse que não queria mais gatos porque vestia um luto comprido sempre que um deles morria. E eu na altura não percebia, porque os gatos eram lindos e fofinhos e divertidos, e eu nunca estava lá a ver o corpo inerte deles quando eram atropelados ou quando adormeciam de velhice.

Eu tenho um hamster. Uma hamster, na verdade, tenho que dizê-lo: o meu único hamster antes desta viveu a vida toda com problemas de autodeterminação sexual, porque nós teimávamos em chamá-lo Algodão, mas a sua anatomia e comportamento ditavam precisamente o contrário. Talvez por isso, ou não, o Algodão tinha tendências suicidas e encontrávamo-lo muitas vezes a cirandar pelo chão da casa. Nunca descobrimos como conseguiu ele (ou ela, na verdade) abrir a tampa da gaiola e saltar o metro e meio de bancada que a erguia do chão sem sofrer graves hemorragias internas. As patitas deviam ser mais fortes do que pareciam ou então a barriga rasa não chegava a tocar o chão. Não sei. Acho que agora também já não interessa.

A verdade é que tenho uma hamster há pouco mais de dois anos. Como os hamsters vivem em média três, a pobre da Chica (sim, é um nome estúpido e a explicação ainda é mais estúpida, por isso mais vale nem contar) está no período a que se chama velhice. Mais, está a entrar naquilo a que se chama senilidade.

A Chica, quando era nova e irreverente, tinha o hábito irritante de, assim que eu punha areia nova e comida e a casa dela mais parecia um hotel de cinco estrelas, virar imediatamente tudo do avesso, derramar a água, virar o prato da comida e depois encher as bochechas até não conseguir atravessar a janela da casa, por onde entra sempre, e ter de entrar pela porta (ela nunca foi convencional). Era uma espécie de rotina, o pobre do bicho não descansava enquanto não punha a casa lá como ela queria. Tudo bem, aprendi a ver esse ritual e, a certa altura, deixei de ligar.

Era movida pelo instinto. O instinto fazia-a ir directamente para o prato da comida, encher as bolsas de sementes e levá-las para o ninho, onde estavam seguros, longe de possíveis predadores, onde teria mantimentos para sobreviver se tivesse de se refugiar. Basicamente, cumpria os desígnios da natureza, ainda que mantida em cativeiro pelos humanos. Por mim.

E assim passou a sua juventude.

Foi então que começou o estranho hábito de andar do lado de fora da roda, contra a grade. Irreverente? Talvez, no início. Mas é muito ténue a linha entre a irreverência e a loucura. Mais tarde, começou a andar pendurada de cabeça para baixo nas grades de cima da gaiola. Eu não fiquei nem um bocadinho surpreendida, pensei que tivesse chegado ao cúmulo da irreverência.

Só recentemente reparei nos terríveis efeitos da senilidade nos animais. É que andar ao contrário na roda, andar pendurada de cabeça para baixo, é compreensível se pensarmos no tédio que era a juventude dela. Mas agora…

Agora eu mudo a casa à Chica e o hotel de cinco estrelas fica intocável. O pobre do bicho bebe um bocadinho de água, não toca na comida e anda de um lado para o outro a cheirar os cantos. Pega numa semente e faz maratonas de uma ponta da gaiola à outra. Bate com a cabeça na roda e fica sem saber onde pôr a bola de sementes que tem na boca. Pousa-a no chão e vai em direcção a casa. Sem comida, sem as bochechas a abarrotar. Entra. Pela porta.

A minha avó sempre disse que não queria mais gatos. E eu não percebia porque não sabia nada da morte. Mas a vida dos hamsters é bem diferente. Uma gaiola é bem diferente. E agora sou eu que digo que não quero mais hamsters! Muito menos gaiolas.

Fábula surrealista

Quando os egos se fartaram de andar sozinhos pelo mundo, decidiram habitar os corpos dos homens. Rapidamente morreram de tédio, porém, porque de dentro todos os corpos são iguais. Os egos encontraram então uma forma de diversão e, para tornarem os corpos diferentes entre si começaram a comer muito. Distinguiam assim, para além dos corpos, os egos que os vestiam. Começaram a inchar bastante e quando se deram conta eram egos grandes, enormes, enchouriçados. Quando já não conseguiam comer mais, começaram a saltar, a saltar e a ver quem conseguia chegar mais alto. A certa altura, um dos egos engravidou e, quando lhe rebentaram as águas turvas, deu à luz a hipocrisia. O outro morreu de inveja, coitado, porque, embora maior, era estéril.

domingo, outubro 14, 2007

Ataque de lirismo (metablogar)

Esta coisa dos blogs tem muito que se lhe diga. Para mim, nunca foi uma obrigação e sempre me deu prazer. Também nunca foi um dever. Só que começou a ser uma coisa agradável que temos de fazer mas que a partir do momento em que deixa de ser algo que nos apetece fazer para passar a ser algo que temos de fazer se torna chata e difícil. Deixei de saber o que queria escrever aqui, portanto, e deixei de te tempo e deixei de ter vontade e deixei, pela parte que me toca, o blog adormecer. Sinto saudades. Podemos ter saudades de algo que é meramente virtual?

O que é isto da blogosfera afinal? Onde estão as pessoas de carne e osso, aquelas que abraçamos, a quem nos abraçamos e deixamos que nos abracem? Onde estão os risos sonoros, as piadas sem piada nenhuma mas que ditas por nós, entre nós, no universo que reconstruímos só para nós para que tudo faça sentido, têm toda a piada do mundo? Onde estão os choros pela dor que nos corrói? Onde estão as palavras ditas, sussurradas a meio tom ao ouvido de quem se ama? Onde estão as pessoas, onde estão?

A blogosfera é magnífica, maravilhosa. Podemos falar com quem está longe, podemos partilhar coisas que de outra maneira era difícil de partilhar – pôr um texto aqui é bem mais simples do que mandar cinquenta cartas, alem de que é infinitamente mais barato. É realmente poderoso o acesso à informação, com tudo o que isso implica. Mas não deixa de ser… agridoce.

Já dizia o professor, tantas vezes exaltado aqui neste blog, o excelentíssimo utilizador do advérbio de modo, que é impossível aos homens estar em tudo com todos os aspectos da sua personalidade, porque isso seria insustentável. Dizia também que nenhum homem é capaz de assumir plenamente a responsabilidade, por mais responsável que se proclame. Curiosamente, foi só isto que me ficou de Introdução ao Direito. E ainda mais curiosamente, lembrei-me disto agora a propósito da blogosfera. Na blogosfera é impossível sermos pessoas por inteiro. Somos só palavras, imagens, nomes. Mas não somos de carne e osso.

Talvez por isso me tenha remetido ao silêncio tanto tempo… Hum… ser ou não ser?

É isso a questão.

quinta-feira, outubro 04, 2007

"Espalhem a notícia"

Foto de J.P. Casainho

Sérgio Godinho é grande. Trinta e três anos depois da festa da liberdade, continua a encher Portugal de música de intervenção. Soube envelhecer bem, o raio do homem, com uma energia impressionante e uma versatilidade incrível. Encheu ontem as cadeiras balofas do TAGV de uma vitalidade espantosa, voltou três vezes ao palco para uma sucessão de encores tão milimetricamente planeados que pareciam improviso.

Impressionante a coordenação do grupo, o ritmo do espectáculo, as novas letras que continuam tão boas como sempre foram. E, em palco, o cantor não é só cantor! É homem de teatro, expressivo, conta as histórias das suas músicas com o próprio corpo, voz, entoação das palavras…

Apetecia mesmo era saltar das cadeiras e pôr toda a gente a dançar, cantando os clássicos a plenos pulmões… Só faltou mesmo (nós ainda berrámos na esperança que nos ouvisse, mas não…) uma das mais especiais…

Mas eu já não digo nada. Espectáculos assim cortam-nos a respiração. Até uma máquina de escrever era música! Sérgio Godinho continua aí, cada vez melhor. Espalhem a notícia!

"Stabat Mater"

Estas coisas devem ser escritas a quente, sob o efeito do espanto que se fumou ao longo de uma hora e meia (excepto se formos críticos de teatro, mas se formos críticos de teatro não fumamos espanto, fumamos cinismo e haxixe, que assim expelimos o ressentimento por não sermos nós os donos do palco). Infelizmente, esta já não vai a quente. Mas, e daí, talvez seja melhor assim.

Eu nunca gostei de monólogos. Talvez porque, para mim, teatro é conflito, comunicação, intensidade e, embora não seja impossível, é muito mais difícil conseguir isto num palco de um actor só. Claro, há sempre os conflitos interiores, mas os conflitos interiores vêem-se melhor na relação com os outros do que na solidão do palco. E depois tenho sempre a sensação, nos monólogos, de que é uma espécie de exibição egocêntrica do actor, uma montra viva das excelentes capacidades dramáticas de alguém. Isto pensava eu dos monólogos e dos actores de monólogos.

Até que vi “Stabat Mater” de António Tarantino. Ou melhor, até que vi Maria João Luís em palco. E fiquei bêbada de espanto do princípio ao fim. Como é que alguém consegue, com um ritmo impressionante, fazer tudo é que é teatro numa hora e meia e sozinha? Como é que aconteceu ali teatro? Não encontro explicação racional. A não ser uma qualidade impressionante do texto, da actriz, do encenador, muito trabalho, claro, e a conquista, à primeira palavra, do público. Mas mesmo assim, há algo que escapa... talvez porque o teatro nao se presta a análises racionais... Não, não sei definir nem explicar o que aconteceu naquele palco.

Só sei que teatro assim é teatro e o resto é conversa.