quarta-feira, abril 25, 2007
arrependimento
Arrependimento. Palavra que pesa na alma. Quem se enche de arrependimento, quem deixa que o arrependimento alastre como uma nódoa na sua vida, não aproveita o presente. Vive atracado no passado. A lamuriar-se, arrependido, pelos erros que o fizeram mudar a rota da sua viagem. Arrependido, tão arrependido, que tendo chegado a rasgar algumas ondas, a avançar para o mar alto, a saborear o marulhar, não chegou onde queria, onde sempre quis, onde sempre desejou chegar. E, assim, arrependido e frustrado, recolheu as velas e voltou ao cais do passado. Chorando musgo pelas frestas da madeira do seu casco envelhecido. Sem querer errar mais, para mais tarde não se arrepender, não avançou. E nem sequer se apercebeu que não tinha chegado mais longe porque se arrependeu. Arrependeu-se de não ter seguido a rota já planeada. Arrependeu-se de ter tomado decisões condicionado. Arrependeu-se até de ter feito planos porque isso o levou ao arrependimento. Nesse cais do ontem, largou a sua âncora, o seu arrependimento, que o fez ficar ali. A certa altura até se sente confortável ali, seguro até. Muito seguro. O arrependimento pesa-lhe, mas também o segura à areia. Não o deixa arriscar em nada. O mar que o rodeia é sempre o mesmo. Até já nem é frio. É quentinho. Já não chora mais. O arrependimento já faz parte dele. Essa âncora já não vai ser subida. Nunca. Ele já sabia que se a subisse, arrepender-se-ia de o ter feito. E ficou ali. feliz.
(Não se chegou a aperceber verdadeiramente dos momentos que poderia ter vivido. Não se chegou a aperceber que bastava ter navegado mais um pouco, com mais um pequeno esforço, dando a volta aos problemas, para chegar a um cais diferente. Bastava isso. Um cais onde se sentiria verdadeiramente feliz. Ele era feliz... mas porque simplesmente não quis arriscar e ver que havia mais. Muito mais para além daquele cais.)
E ali apodreceu.
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2 comentários:
É exactamente isso.
E o mais horrível é que é tentador, porque a certa altura "o mar já nem é frio. É quentinho". Um mar quentinho de amargura.
(mas também é preciso arrependimento, só que sem encher a alma, porque quem nunca se arrependeu nunca errou e quem nunca errou nunca aprendeu)
PS: devias arrepender-te de não escrever mais aqui! :)
beijo!
Esse texto magou-me. E não sei em que direcção.
Este texto é incómodo, e ao mesmo tempo um aguilhão necessário e ousa ser mesmo, a tempos, de uma esperança, de um conforto prometeico.
Eu não quero apodrecer.
Desculpa não estar a escrever coisa com coisa, mas isso é tão somente porque, como uma âncora, o texto tocou fundo as areias movediças do que se mexe em mim e o pó que levantou ao cair tolda-me a visão para poder ser claro.
(PS: Mas concordo com a Rita que quero mais coisas tuas, para mais desta natureza, que é a natureza da Verdade).
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