sábado, junho 10, 2006

Para onde?

Andava em passo rápido (demasiado rápido, tendo em conta o calor) para ir ter com ela ao sítio combinado. Já estava atrasada. Como sempre. Uma gota de suor ameaçava deslizar sobre a testa até aterrar na sobrancelha. Os óculos de sol magoavam-me atrás das orelhas e os "fones" do Mp3 também não estavam a ajudar, escorregando constantemente. Já nem me lembro do que estava a ouvir. Tinha medo que o telemóvel tocasse de novo, irritado por ainda não ter chegado. Só pensava em chegar, desculpar-me pelo atraso e aguentá-la mesmo que estivesse num mau dia. Nem reparava na primavera dos jardim onde pass(e)ava em correria, nem que a poeira se ia agarrando subtilmente aos meus dedos e sandálias, nem que a relva estava mesmo bem tratada, nem que os bancos reluziam, vermelhos, entre a sombra e a luminosidade gritante do sol que brilhava com todo o esplendor. Foi então que vi. Tão raro! Tão bonito! Estavam serenamente sentados. As costas descansavam encostadas ao banco, as ancas dilatavam-se comodamente e tocavam-se de lado, uma das mãos de cada um ganhava mais 5 dedos do outro num entrelaçar de carinho. Os olhares não se cruzavam, as bocas fechavam-se em lábios finos e já vincados, as rugas desenhavam as formas do tempo nos rostos, os cabelos dançavam com a brisa que passava, brincando, grisalhos, em desalinho. Estavam felizes. Numa paz que poderia ser irritante no meio da minha correria. Mas não foi. Aquela imagem fez-me respirar. Acalmar. Tão velhinhos, tão pacíficos, tão enamorados, tão felizes. Olhavam em frente, cada um pensando no que queria, sem trocar impressões, guardando apenas a mão do outro dentro da sua. Apeteceu-me ficar ali. Falar com eles. Saber-lhes a história. Ou ficar só a olhar. A admirar a persistência com que se amam. Como mantêm um relação (é tão difícil construir e manter uma boa relação!). O telemóvel lá tocou. Já está fula. "Estou a ir" murmuro. (desligo e continuo o meu caminho).Estou a ir. Para onde?

6 comentários:

Anónimo disse...

"Para onde?", perguntas tu...
Creio que a resposta é simples:construir uma boa relação!
Beijo, Tiago

Anónimo disse...

Se às vezes é difícil começá-las (ou começar a senti-las), construi-las é um forte desafio. Mas onde estaria a piada se fosse fácil?...
Beijo =)

Anónimo disse...

Não creio que o difícil seja começa-las, mas sim que se tornem eternas e que sejam mesmo boas, isso sim é um grande desafio, um trabalho constante... porque no que diz respeito a começa-las, isso ocorre tão simplesmente, e por vezes nem sequer te dás conta (é claro que depois te apercebes e bem:P)!Mc 12, 31; Creio que seja um pequeno resumo.
Beijo, T

Anónimo disse...

O começar de uma relação depende da pessoa com quem queres relacionar-te. Às vezes é só um click, uma conversa, um olhar, descobrir que têm muitas coisas em comum... com outras não é assim tão fácil. Por isso é que dizia que às vezes é difícil começá-las. Mas concordo contigo quando dizes que o mais difícil é fazer com que "se tornem eternas".No fundo, as relações exigem sempre empenho e vontade de ambos. E tempo. E disponibilidade. E fé. E (last but not the least) Amor. Se não fossem tão indipensáveis, pelo trabalho que dão seriam dispensáveis. =)

rita disse...

Para onde?
Sinceramente não sei.
Às vezes sinto que andamos todos a correr na ânsia de chegar a um "onde" que desconhecemos completamente.
Outras sinto que talvez a beleza de tudo isto seja precisamente esse desconhecido "para onde"...

Texto fantástico!

Anónimo disse...

Bem...eu não gosto muito de comentar estas coisas, mas. Vocês escrevem coisas que demoram a digerir...fazem pensar, descobrir significados! Eu, com os meus ricos 15 anos, tenho algum medo de dizer disparates! Mesmo assim...Para onde? Gostava de ir para o sítio que esses velhinhos conseguiram descobrir! Espero estar a ir nessa direcção.